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"isso é escrever. tira sangue com as unhas. e não importa a forma, não importa a "função social", nem nada, não importa que, a princípio, seja apenas uma espécie de auto-exorcismo. mas tem que sangrar a-bun-dan-te-men-te. você não está com medo dessa entrega? porque dói, dói, dói. é de uma solidão assustadora. a única recompensa é aquilo que laing diz que é a única coisa que pode nos salvar da loucura, do suicídio, da auto-anulação: um sentimento de glória interior. essa expressão é fundamental na minha vida."
(caio fernando abreu)

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

todo sentido

era o tricotar de sua doce voz que me fazia perder o chão. a maioria dos sentidos foram levados com a rajada de vento que me cobriu quando você se aproximou de mim. em ínumeras parcelas (repletas de juros) de segundos, os sentidos se apuravam um a um, como numa rodada de carteado, onde cada um joga na sua determinada vez.
o primeiro foi a olfato. senti teu cheiro rude de longe, invadindo minhas narinas e perturbando-me a existência. as notas amadeiradas, com um delicioso toque de musgos venenosos, me entorpeciam, e, pela primeira vez, senti-me trôpega, sem o controle das minhas pernas.
imediatamente após a primeira nota invadir-me por completo o paladar ficou aguçado e, sim, eu tremi. me lembrei do teu gosto e de todo o prazer que teus sabores traziam. tua amargura coberta de geleia de cassis me  fazia lembrar da louca vontade de recordar todos os sabores que nunca havia provado.
estranhamente, o terceiro foi a visão. que juro que nem era necessária, pois... ao fechar meus olhos já poderia contemplar o prazer de ver tuas formas e expressividade. de olhos abertos ou fechados, você estava ali, na minha frente.
o tato. ah, o tato! meu corpo respondia ao seu toque em ondas e espamos. todas as terminações nervosas chocavam-se com a onda de frios e tremores quentes que nosso contato produzia. um vulcão em erupção. o choque das placas tectônicas. a pangéia. tudo.
mas, o que mais queria era o apurar dos meus ouvidos. o que mais desejava era o momento da audição. quando o tintilhar de tuas cordas vocais pronunciassem o que desejei sempre ouvir...
(...)
isso sim... faz todo o sentido.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

sola

acreditava no poder no eterno até sentir a tua luz ofuscar o meu olhar. eu até conseguia imaginar a eternidade nos enlaçando até sentir seu cheiro me invadir, levando em suas notas a minha sanidade. acreditava no "pra sempre" até perceber que o simples fato de me fazer perder a visão e o chão por uma única vez, valeu por uma vida inteira de promessas e amanhãs.

por isso, acredito no hoje. no hoje e mais uns segundos de beijos. e só.
só o hoje contigo me basta e me sacia.
só.